quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Prólogo - Rangers Ordem dos Arqueiros VOL 2

Halt e Will estavam seguindo os Wargals por três dias. As quatro criaturas grandes e selvagens, soldados do re-belde comandante Morgarath tinham sido vistas passando pelo Feudo Redmont em direção ao norte. Assim que a informação chegou aos ouvidos do arqueiro, ele saiu para interceptá-los, acompanhado de seu jovem aprendiz.
— De onde será que eles vieram, Halt? — Will perguntou durante uma de suas curtas paradas para des-canso. — O Desfiladeiro dos Três Passos já não está bem vigiado?
O Desfiladeiro dos Três Passos era o único acesso existente entre o reino de Araluen e as Montanhas da Chuva e da Noite, onde Morgarath mantinha seu quar-tel-general. Agora que o reino estava se preparando para a guerra com Morgarath, a companhia de infantaria e os ar-queiros tinham sido enviados para reforçar a pequena guarnição permanente na estreita passagem até que o e-xército principal pudesse se reunir.
— Esse é o único lugar de onde eles podem vir em grande número — Halt concordou. — Mas um pequeno
grupo como esse poderia entrar no Reino pela barreira de penhascos.
O domínio de Morgarath era um inóspito planalto que se erguia nas montanhas sobre as fronteiras no sul do reino. Do Desfiladeiro dos Três Passos, no leste, saía uma linha de penhascos íngremes e escarpados, em direção ao oeste, formando a fronteira entre o planalto e Araluen. À medida que avançavam para o sudoeste, os penhascos mergulhavam em outro obstáculo chamado fenda: uma abertura na terra que corria para o mar e separava o terri-tório de Morgarath do reino dos celtas.
Foram essas fortificações naturais que mantiveram Araluen e sua vizinha Céltica a salvo dos exércitos de Morgarath nos últimos dezesseis anos. Por outro lado, e-las também protegeram o rebelde comandante das forças de Araluen.
— Pensei que fosse impossível passar por esses penhascos — Will comentou.
— Nenhum lugar é realmente impossível de atra-vessar — Halt retrucou com um sorriso sombrio. — Principalmente se você não der importância a quantas vi-das vai perder tentando provar esse fato. Na minha opi-nião, eles usaram cordas e ganchos e esperaram uma noite sem luar e de mau tempo para conseguirem passar pelas patrulhas da fronteira.
Ele se levantou, mostrando que o descanso tinha chegado ao fim. Will também se ergueu, e os dois foram até os cavalos. Halt grunhiu levemente quando montou na
sela. O ferimento que tinha sofrido na batalha com os dois Kalkaras ainda o incomodava um pouco.
— Minha principal preocupação não é saber de onde eles vieram — ele continuou. — É saber para onde estão indo e o que pretendem.
Halt mal tinha acabado de falar quando ele e Will ouviram um grito vindo de algum ponto adiante deles, seguido por uma confusão de grunhidos e, finalmente, pelo choque de armas.
— E talvez a gente descubra isso bem depressa! — concluiu.
Ele fez Abelard galopar, controlando-o com os jo-elhos enquanto as mãos, sem esforço, escolhiam uma fle-cha e a ajustavam à corda de seu enorme arco. Will subiu na sela de Puxão com a ajuda das mãos e galopou atrás do mestre. Ele não conseguia imitar a habilidade de Halt para montar sem usar as mãos, pois precisava da mão direita para segurar as rédeas enquanto segurava o arco com a esquerda.
Eles estavam atravessando um bosque com poucas árvores, deixando que os espertos cavalos escolhessem o melhor caminho. De repente, saíram do meio das árvores para uma ampla campina. Abelard, obedecendo a um co-mando de seu cavaleiro, parou, seguido imediatamente por Puxão. Will deixou cair as rédeas no pescoço do ani-mal e sua mão instintivamente procurou uma flecha na aljava e a posicionou no arco.
Uma grande figueira crescia no meio do terreno com pouca vegetação. Um pequeno acampamento tinha sido montado junto do tronco. Um fio de fumaça ainda subia da fogueira, e uma mochila e um cobertor enrolado estavam no chão ao lado dela. Os quatro Wargals cerca-vam um homem que estava de costas para a árvore. Sua espada ainda os mantinha longe dele, mas os Wargals fa-ziam leves movimentos em sua direção, tentando encon-trar uma brecha para atacá-lo. Eles estavam armados com espadas curtas e machados, e um deles carregava uma pe-sada lança de ferro.
Will respirou fundo ao ver as criaturas. Depois de seguir suas pegadas por tanto tempo, era um choque vê-los claramente tão de repente. Seus corpos eram pare-cidos com os de ursos; eles tinham focinhos longos e for-tes e presas amarelas de cachorro, agora expostas ao ros-narem para sua vítima. Eram cobertos por pelos desgre-nhados e usavam armaduras pretas de couro. O homem estava vestido de modo parecido, e sua voz tremia de medo ao repelir as tentativas de ataque.
— Para trás! Estou cumprindo uma missão para lorde Morgarath. Para trás, eu ordeno! Eu ordeno em nome de lorde Morgarath!
Halt fez que Abelard se virasse, de modo a ter es-paço para puxar a flecha que já estava preparada no arco.
— Larguem as armas! Todos vocês! — ele gritou.
Cinco pares de olhos se voltaram para ele quando os quatro Wargals e sua presa se viraram surpresos. O
Wargal que segurava a lança se recuperou primeiro. Per-cebendo que o espadachim estava distraído, disparou para a frente e perfurou seu corpo com a lança. Um segundo depois, a flecha de Halt se enterrou no coração do Wargal e ele caiu morto ao lado da presa ferida. Quando o espa-dachim caiu de joelhos, os outros Wargals investiram con-tra os dois arqueiros. Mesmo desajeitadas e enormes, as três criaturas moveram-se numa velocidade incrível.
O segundo tiro de Halt atingiu o Wargal da es-querda. Will atirou em outro à direita e percebeu no mesmo instante que tinha julgado mal a velocidade da cri-atura abrutalhada: a flecha passou sibilando no espaço onde o Wargal tinha estado um segundo antes. Sua mão voou para a aljava à procura de outra flecha, e ele ouviu um gemido rouco de dor quando o terceiro tiro de Halt atingiu o peito da criatura que estava no centro. Então Will soltou a segunda flecha na direção do Wargal sobre-vivente, agora assustadoramente perto.
Apavorado diante dos olhos selvagens e das presas amarelas da criatura, o garoto atirou, sentindo que a flecha iria passar longe do alvo. O Wargal estava quase sobre ele.
Quando a criatura rosnou triunfante, Puxão veio em ajuda de seu dono. O pequeno cavalo empinou e ata-cou o monstro terrível com as patas dianteiras, avançando em seguida alguns passos em sua direção. Will, tomado de surpresa, agarrou-se ao alto da sela.
O Wargal ficou igualmente surpreso. Como todos de sua espécie, ele tinha um profundo medo instintivo de
cavalos, um medo nascido na Batalha de Hackman Heath, dezesseis anos antes, na qual o primeiro exército de War-gals de Morgarath foi dizimado pela cavalaria de Araluen. O monstro hesitou por um segundo fatal, recuando diante dos cascos impiedosos do cavalo.
A quarta flecha de Halt atingiu a criatura na gar-ganta e, devido à curta distância, a atravessou. Com um último grito agudo, o Wargal caiu morto na grama.
Pálido, Will escorregou para o chão, pois não con-seguia se manter em pé. Teve que se segurar em Puxão para se levantar. Halt saltou da sela depressa, foi até o ga-roto e o abraçou.
— Está tudo bem, Will — a voz grave atravessou o medo que enchia a mente do rapaz. — Já passou.
Mas Will sacudiu a cabeça negativamente horrori-zado com a rápida série de acontecimentos.
— Halt, eu errei... duas vezes! Entrei em pânico e errei!
Ele foi tomado por uma profunda sensação de vergonha por ter causado tamanha decepção ao seu mes-tre. O braço de Halt apertou ainda mais o ombro do ga-roto, que olhou para o rosto barbado e os olhos escuros e profundos do mestre.
— Há uma grande diferença entre atirar num alvo e num Wargal que está pronto para atacar. Geralmente o alvo não quer matar você.
Halt acrescentou as últimas palavras num tom mais suave. Ele percebeu que Will estava em choque. “E não é para menos”, ele pensou sombriamente.
— Mas... eu errei...
— E aprendeu uma lição. Da próxima vez, não vai errar. Agora você sabe que é melhor atirar uma flecha com atenção do que duas com pressa — Halt disse com firmeza.
Então, pegou o braço de Will e fez o garoto se virar para o local do acampamento debaixo da figueira.
— Vamos ver o que achamos ali — ele sugeriu pondo um fim na conversa.
O homem vestido de preto e o Wargal estavam mortos, caídos lado a lado. Halt se ajoelhou ao lado do homem e o virou, assobiando surpreso.
— É Dirk Reacher — ele informou meio para si mesmo. — Ele é a última pessoa que eu esperaria ver a-qui.
— Você conhece ele? — Will perguntou.
Sua insaciável curiosidade já o estava ajudando a esquecer os terríveis minutos anteriores, como Halt sabia que iria acontecer.
— Eu persegui ele até que saísse do reino, há uns cinco ou seis anos — o arqueiro contou. — Era um co-varde e assassino. Desertou do exército e encontrou seu lugar, junto de Morgarath — ele fez uma pausa. — Parece que Morgarath está se especializando em recrutar pessoas como ele. Mas o que esse homem estava fazendo aqui...?
— Ele disse que estava numa missão para Morga-rath.
— Duvido. Os Wargals estavam caçando ele e so-mente Morgarath poderia ter dado essa ordem. Dificil-mente os Wargals perseguiriam alguém que estivesse tra-balhando para o chefe deles. Acho que estava desertando outra vez. Ele fugiu de Morgarath, e os Wargals foram mandados atrás dele.
— Por quê? — Will perguntou. — Por que deser-tar?
— A guerra está para começar — Halt disse dando de ombros. — Pessoas como Dirk tentam evitar esse tipo de aborrecimento.
Ele pegou a mochila que estava perto da fogueira do acampamento e começou a remexer dentro dela.
— Você está procurando alguma coisa em especial? — Will perguntou.
Halt franziu a testa e, cansado de olhar dentro da mochila, derramou o conteúdo no chão.
— Bom, me ocorreu que, se ele tivesse desertado e quisesse voltar para Araluen, teria que levar alguma coisa para trocar por sua liberdade. Assim...
Sua voz desapareceu aos poucos quando ele apa-nhou um pedaço de pergaminho cuidadosamente dobrado entre as poucas roupas e utensílios de cozinha. Ele o exa-minou rapidamente e ergueu uma das sobrancelhas leve-mente. Depois de quase um ano convivendo com o ar-queiro grisalho, Will sabia que aquilo era o equivalente a
um grito de espanto. Ele também sabia que, se interrom-pesse Halt antes que terminasse de ler, seu mentor sim-plesmente o ignoraria. Will esperou até que Halt dobrasse o papel, levantasse devagar e olhasse para o aprendiz, en-xergando a pergunta no olhar do garoto.
— É importante?
— Ah, acho que posso dizer que sim — Halt res-pondeu. — Parece que tropeçamos nos planos de batalha de Morgarath para a próxima guerra. Acho melhor vol-tarmos para Redmont.
Ele assobiou baixinho, e Abelard e Puxão trotaram para junto de seus donos.
Das árvores, a várias centenas de metros de distân-cia, cuidadosamente a favor do vento para que os cavalos dos arqueiros não sentissem o cheiro do intruso, olhos inamistosos os observavam. Seu dono observou os dois arqueiros se afastarem da cena da pequena batalha e então se virou para o sul, na direção dos penhascos. Era hora de informar Morgarath que seu plano tinha dado certo.

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