sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Capitulo 16 - Rangers Ordem dos Arqueiros VOL 2

O túnel, plano no início, começou a descrever uma subi-da íngreme à medida que Will continuava a andar, dei-xando Horace para trás. As paredes e o chão mostravam sinais das enxadas e brocas dos celtas quando rasgaram e quebraram as pedras para alargar o caminho.
Will adivinhou que o estreito túnel original não ti-nha sido nada mais do que uma fenda natural na pedra; uma simples fenda. E viu que ela tinha sido muito alarga-da até haver espaço para quatro ou cinco homens anda-rem lado a lado. E mesmo assim ela subia até o coração das montanhas.
Um círculo de luz mostrou o fim do túnel. Ele cal-culou que talvez tivesse andado 300 metros ao todo, e o fim estava a uns 40 de distância. A luz que via parecia ser mais forte do que a simples luz da Lua e, quando saiu cuidadosamente do túnel, descobriu o motivo.
Ali as colinas se separavam e formavam um grande vale de cerca de 200 metros de largura e meio quilômetro de comprimento. De um lado, a luz da Lua mostrava i-mensas estruturas de madeira que levavam a trechos mais
elevados do planalto. Depois de observá-las por alguns momentos, ele percebeu que eram escadas. O chão do va-le era iluminado por fogueiras de acampamento, e havia centenas de vultos se movendo na luz trêmula e alaranja-da. Will deduziu que ali devia ser a área onde o exército de Morgarath iria se reunir. Naquele momento, era onde os Wargals mantinham os prisioneiros celtas à noite.
Ele parou, tentando formar uma imagem de toda a situação. O planalto que formava a maior parte do domí-nio de Morgarath ainda estava pelo menos 50 metros aci-ma daquele ponto. Mas os degraus e o declive menos forte das colinas ao redor facilitariam o acesso ao vale. O vale em si devia estar aproximadamente 30 metros acima do nível em que estava a ponte. O túnel em declive levaria as tropas até a ponte. Mais uma vez, as palavras de Halt eco-aram em seu ouvido: nenhum lugar é realmente impossí-vel de atravessar.
Ele foi para a esquerda da entrada do túnel e se es-condeu num amontoado de rochas e pedras enormes, para avaliar a situação. Havia um alambrado tosco no centro do vale. Dentro da cerca de madeira, ele viu várias fogueiras pequenas, cada uma com um grupo de pessoas sentadas ou espalhadas ao seu redor. Aquele certamente era o re-cinto dos prisioneiros.
Fogueiras maiores fora do recinto marcavam os lu-gares onde os Wargals estavam acampados. Ele viu as e-normes formas cambaleantes com clareza contra a luz do fogo. No entanto, havia uma fogueira perto dele que pare-
cia diferente. Os vultos pareciam mais eretos, e a forma como ficavam em pé e andavam tinha um aspecto mais humanóide. Curioso, ele procurou se aproximar, esguei-rando-se pela noite quase sem fazer nenhum barulho, movendo-se rapidamente de um esconderijo para outro até chegar à beira do círculo de luz oferecido pelo fogo — um ponto em que sabia que a escuridão, por contraste, iria parecer mais forte para os que estavam sentados ao redor do fogo.
Havia um pedaço de carne assando lentamente no fogo, e o cheiro o fez ficar com água na boca. Ele tinha viajado por dias comendo rações frias, e a carne enchia o ar com um aroma delicioso. Will sentiu o estômago roncar e o medo percorrer seu corpo. Seria o máximo da falta de sorte ser traído por um estômago barulhento. O medo resolveu o problema matando seu apetite. Com a fome mais ou menos sob controle, ele espiou por trás de uma rocha baixa perto do chão para poder ver melhor os vul-tos que comiam junto do fogo.
Um deles se inclinou para a frente para cortar um pedaço de carne, fazendo malabarismos com o pedaço de comida quente e gorduroso na mão depois de apanhá-lo. O movimento fez que a luz do fogo brilhasse diretamente sobre ele, e Will viu que aqueles não eram Wargals. A cal-cular por seus coletes rústicos de pele de ovelha, calças de lã amarradas com fitas e pesadas botas de pele de foca, constatou que eram escandinavos.
Uma observação mais cuidadosa o fez ver os capa-cetes com chifres, escudos redondos de madeira e achas empilhados num dos lados do acampamento. Ele se per-guntou o que estariam fazendo ali, tão longe do oceano.
O homem que tinha se mexido terminou de comer a carne e limpou as mãos no colete de pele de carneiro. Ele arrotou e se ajeitou numa posição mais confortável perto do fogo.
— Vou ficar muito satisfeito quando os homens de Ovlak chegarem — ele disse no sotaque rústico e quase indecifrável da Escandinávia.
Will sabia que os escandinavos falavam a mesma língua do reino, mas ao ouvi-la agora pela primeira vez ele quase não a reconheceu.
Os outros lobos do mar concordaram grunhindo. Havia quatro deles em volta do fogo. Will foi um pouco para a frente para ouvi-los melhor e então ficou paralisa-do, horrorizado, quando viu o inconfundível vulto cam-baleante de um Wargal se movendo diretamente em sua direção do outro lado do fogo.
Os escandinavos escutaram quando ele se aproxi-mou e olharam para cima cautelosos. Com uma forte sen-sação de alívio, Will percebeu que a criatura não estava andando até ele, mas sim até a fogueira dos escandinavos.
— Opa — disse um dos escandinavos em voz bai-xa. — Aí vem uma das belezas de Morgarath.
O Wargal tinha parado do outro lado do fogo. Ele grunhiu alguma coisa ininteligível para o grupo de homens do mar. O que tinha acabado de falar deu de ombros.
— Desculpe, bonitão. Não entendi o que você dis-se.
Em sua voz, havia um toque evidente de hostilida-de, que o Wargal pareceu perceber. Ele repetiu a frase, agora zangado. Novamente, o círculo de guerreiros escan-dinavos deu de ombros.
O Wargal grunhiu novamente, cada vez mais furi-oso. Apontou para a carne que pendia sobre o fogo e de-pois para si mesmo. Em seguida gritou para os escandi-navos mostrando com gestos que queria comer.
— O brutalhão feio quer nossa carne — um dos escandinavos disse.
Um baixo rosnado de descontentamento saiu do grupo.
— Ele que cace a própria carne — disse o primeiro homem.
O Wargal entrou no círculo. Ele tinha parado de gritar. Simplesmente apontou para a carne e voltou os o-lhos vermelhos e brilhantes para o homem que tinha fa-lado. De alguma forma, o silêncio era mais ameaçador do que seus gritos.
— Cuidado, Erak — avisou um dos escandinavos. — Somos em menor número neste momento.
Erak fez cara feia para o Wargal durante um se-gundo e então pareceu entender a sensatez do conselho do amigo.
— Vá em frente. Pegue — ele disse com aspereza e fez um gesto zangado em direção à carne.
O Wargal se aproximou, pegou o espeto de madeira do fogo e deu uma grande mordida na carne, arrancando um bom pedaço. Mesmo de onde estava, quase sem ousar respirar, Will viu a luz feia de triunfo nos olhos vermelhos do animal. Em seguida, o Wargal se virou abruptamente e saiu do círculo, obrigando alguns dos escandinavos a se afastarem depressa para não serem pisoteados. Eles ouvi-ram seu riso gutural desaparecendo na escuridão.
— Essas coisas horríveis me dão arrepios — Erak murmurou. — Não sei por que temos que ficar com eles.
— Porque Horth não confia em Morgarath — um dos outros retrucou. — Se não estivermos com eles, esses malditos homens-urso vão ficar com todo o produto do roubo para eles, e tudo o que receberemos vai ser a bata-lha terrível nas Planícies de Uthal.
— E uma marcha dura — outro acrescentou. — O que também não seria nada divertido de fazer, mesmo com os homens de Horth. Dar a volta na Floresta Thorn-tree para surpreender o inimigo pela retaguarda vai ser bem difícil, pode ter certeza.
Will franziu a testa quando ouviu essas palavras. Evidentemente, Morgarath e Horth, que Will imaginou ser um líder guerreiro escandinavo, estavam planejando outra
surpresa traiçoeira para as forças do reino. Ele tentou vi-sualizar o mapa das terras que cercavam as planícies de Uthal, mas as lembranças eram vagas. Deveria ter presta-do mais atenção às aulas de geografia de Halt.
— Por que geografia é tão importante? — ele se lembrou de ter perguntado ao professor.
— Porque mapas são importantes se você quiser saber onde o seu inimigo está e para onde vai — tinha si-do a resposta.
Aborrecido, Will percebeu naquele momento como o mestre estava certo. De repente, ao pensar no seu sábio e capaz professor, Will se sentiu muito só e bastante per-dido.
— Seja como for — Erak dizia —, as coisas vão ser diferentes quando os homens de Ovlak chegarem. Embo-ra pareça que eles estão levando tempo demais para isso.
— Relaxe — disse um colega. — Leva alguns dias para conduzir 500 homens pelos Penhascos do Sul. Lem-bre o tempo que nós levamos.
— É — disse outro. — Mas nós estávamos abrin-do uma trilha. Eles só precisam seguir ela.
— Bom, espero que cheguem logo — Erak disse, levantou e se espreguiçou. — Bom, eu vou dormir, pesso-al, assim que fizer minhas necessidades.
— Bem, não vá fazer perto do fogo — um dos ou-tros falou irritado. — Vá para trás daquelas pedras ali.
Aterrorizado, Will se deu conta de que o escandi-navo tinha apontado as pedras onde ele estava escondido.
E agora Erak, rindo para o outro homem, estava andando em sua direção. Will precisava ir embora. Ele se moveu rapidamente de costas por alguns metros e depois, raste-jando depressa de bruços, usou todo o seu treinamento e suas habilidades naturais para se confundir com a paisa-gem.
Ele tinha se afastado cerca de 20 metros quando ouviu um barulho de líquido caindo no chão vindo de perto de onde tinha se escondido. Em seguida ouviu um suspiro de satisfação e, ao olhar para trás, viu o vulto des-cabelado de Erak recortado contra o brilho de centenas de fogueiras no vale.
Percebendo que o escandinavo estava concentrado no que fazia, Will deslizou pela escuridão e voltou para o túnel. Andou com cuidado os primeiros metros, permi-tindo que seus olhos se acostumassem à luz fraca das to-chas, mas logo começou a correr, quase sem fazer barulho no piso arenoso com as botas macias.

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