sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Capitulo 15 - Rangers Ordem dos Arqueiros VOL 1


Will conduziu Puxão lentamente pela lotada feira que tinha sido montada fora dos muros do castelo. Todos os habitantes da vila e do castelo pareciam estar lá, e ele tinha que cavalgar com cuidado para que Puxão não pisasse no pé das pessoas.
Era o Dia da Colheita, ocasião em que toda a safra era reunida e armazenada para os meses de inverno que viriam. Depois de um mês difícil de colheita, tradicionalmente o barão dava esse feriado ao povo. Todos os anos, nessa época, a feira itinerante vinha para o castelo e armava barracas e tendas. Havia engolidores de fogo e malabaristas, cantores e contadores de histórias. Havia barracas em que se podia tentar ganhar prêmios jogando bolas macias de couro em pirâmides feitas de pedaços de madeira ou jogando argolas em cubos. Às vezes, Will tinha a impressão que os cubos eram um pouquinho maiores do que as argolas e, para falar a verdade, ele nunca tinha visto ninguém ganhar nenhum prêmio. Mas as brincadeiras eram muito divertidas, e o barão pagava tudo do próprio bolso.
Naquele momento, porém, Will não estava preocupado com a feira e suas atrações. Ele teria tempo para elas mais tarde naquele dia. Agora, estava a caminho de se encontrar com seus antigos colegas protegidos.
Segundo a tradição, todos os mestres de ofício davam folga aos seus aprendizes no Dia da Colheita, mesmo que não tivessem participado da colheita em si. Will tinha se perguntado durante semanas se Halt estaria ou não de acordo com a prática. O arqueiro parecia não dar importância às tradições e tinha seu jeito de fazer as coisas. Mas, duas noites antes, sua ansiedade tinha sido tranquilizada.
Halt tinha dito, de mau humor, que o garoto podia tirar uma folga, mesmo que provavelmente fosse esquecer tudo o que tinha aprendido nos últimos três meses.
Aqueles três meses tinham sido uma época de treino constante com o arco e as facas que Halt lhe tinha dado. Três meses rastejando pelos campos fora do castelo, movendo-se entre um minguado esconderijo e outro, tentando se movimentar sem que os olhos de águia de Halt o vissem. Três meses cavalgando e cuidando de Puxão, formando um elo especial de amizade com o pequeno pônei.
“Essa foi a melhor parte de todas”, ele pensou.
Agora, estava pronto para o feriado e para se divertir um pouco. Mesmo o pensamento de que Horace estaria lá, não diminuía seu prazer. Talvez alguns meses de treinamento na Escola de Guerra tivessem mudado um pouco os modos agressivos do garoto.
Jenny tinha arranjado o encontro para o feriado, encorajando os outros a se juntar a ela com a promessa de uma fornada de tortas de carne que traria da cozinha. Ela já era uma das melhores alunas de mestre Chubb, e ele alardeava a habilidade dela para quem quisesse ouvir dando bastante ênfase ao papel essencial que seu treinamento tinha desempenhado no aprendizado, é claro.
O estômago de Will roncou com prazer ao pensar nas tortas. Ele estava morrendo de fome, já que não tinha tomado café de propósito para deixar lugar para elas. As tortas de Jenny já eram famosas no Castelo Redmont.
Ele tinha chegado cedo ao ponto de encontro, desmontando de Puxão e o levando para a sombra de uma macieira. O pequeno pônei levantou a cabeça e olhou desejosamente para as maçãs nos galhos, totalmente fora de seu alcance. Will sorriu para ele, subiu na árvore depressa, apanhou uma fruta e a deu ao animal.
— Só vai ganhar uma — ele disse. — Você sabe o que Halt acha de comer demais.
Puxão balançou a cabeça impaciente. Esse ainda era um ponto de divergência entre ele e o arqueiro. Will olhou ao redor. Não havia sinal dos outros, então ele se sentou à sombra da árvore e se recostou no tronco nodoso para esperar.
— Ora, é o jovem Will, não é mesmo? — perguntou uma voz grave logo atrás dele.
Will se levantou rapidamente e tocou a testa num cumprimento educado. Era o barão Arald, sentado no seu gigantesco cavalo de batalha e acompanhado por vários de seus principais cavaleiros.
— Sim, senhor — Will respondeu nervoso. Ele não estava acostumado a ver o barão lhe dirigir a palavra. — Um bom Dia da Colheita para o senhor.
O barão fez um gesto de cabeça e se inclinou para a frente, apoiado confortavelmente na sela. Will teve que levantar a cabeça para olhar para ele.
— Devo dizer, meu jovem, que você parece fazer parte da paisagem — o barão comentou. — Quase não o vi com essa capa cinza de arqueiro. Halt já lhe ensinou todos os seus truques?
Will olhou para a capa cinza e verde que estava usando. Halt a tinha dado algumas semanas atrás e tinha lhe mostrado como essa combinação de cores disfarçava a silhueta de quem a usava e o ajudava a se misturar à paisagem. Aquela era uma das razões pelas quais os arqueiros podiam se deslocar sem serem vistos com tanta facilidade.
— É a capa, senhor — Will afirmou. — Halt a chama de camuflagem.
O barão assentiu, pois certamente já conhecia o termo, que ainda era um conceito novo para Will.
— Só não a use para roubar mais bolos — ele disse com uma severidade fingida, e Will sacudiu a cabeça depressa.
— Ah, não, senhor! Halt me disse que, se eu fizer outra coisa desse tipo, vai dar umas palmadas no meu trase... — ele parou envergonhado, pois não sabia se “traseiro” era uma palavra que se podia dizer na presença de alguém tão importante como o barão.
O barão assentiu novamente, tentando não deixar que um sorriso largo aparecesse em seu rosto.
— Tenho certeza que sim. E como você está se dando com ele, Will? Está gostando de aprender a ser um arqueiro?
Will ficou quieto. Para falar a verdade, não tinha tido tempo para pensar se estava gostando ou não. Passava os dias muito ocupado aprendendo novas habilidades, treinando com o arco e as facas e trabalhando com Puxão. Aquela era a primeira vez em três meses que tinha alguns instantes para realmente pensar no assunto.
— Acho que sim — ele disse hesitante. — É que... — a voz dele desapareceu, e o barão o olhou com atenção.
— É que...? — ele insistiu.
Will mudou de posição, desejando que sua boca não continuasse a colocá-lo sempre nessas situações por falar demais. As palavras acabavam surgindo antes que ele tivesse tempo de pensar se queria dizê-las ou não.
— É que... Halt nunca sorri — continuou pouco à vontade. — Ele está sempre tão sério.
Ele teve a impressão de que o barão estava escondendo um sorriso.
— Bem, você sabe que ser um arqueiro é um negócio sério — o barão falou. — Tenho certeza de que Halt dá essa impressão a você.
O tempo todo Will disse arrependido e, desta vez, o barão não conseguiu deixar de sorrir.
— É só prestar atenção ao que ele diz, jovem. Você está aprendendo um trabalho muito importante.
— Sim, senhor — Will ficou um pouco surpreso por perceber que concordava com o barão.
Arald estendeu a mão para apanhar as rédeas. Seguindo um impulso, antes que os nobres se afastassem, Will deu um passo à frente.
— Desculpe, senhor — ele disse hesitante, e o barão se virou para olhá-lo.
— Sim, Will?
Will mexeu os pés de novo e continuou.
— Senhor, lembra-se de quando seus exércitos lutaram contra Morgarath?
O rosto alegre do barão Arald foi tomado por um ar pensativo.
— Não vou esquecer isso tão depressa, garoto. Por que quer saber?
— Senhor, Halt me disse que foi um arqueiro que mostrou à cavalaria o caminho secreto através de Slipsunder para que ela pudesse atacar o inimigo pelas costas...
— Isso é verdade — Arald confirmou.
— Eu tenho me perguntado, senhor, qual era o nome do arqueiro — Will terminou, sentindo-se corar com sua ousadia.
— Halt não lhe contou? — o barão perguntou.
Will deu de ombros.
— Ele disse que nomes não são importantes. Disse que o jantar era importante, mas nomes, não.
— Mas você acha nomes importantes, apesar do que o seu mestre lhe disse? — o barão retrucou, parecendo franzir o cenho novamente.
Will engoliu em seco e prosseguiu.
— Acho que foi o próprio Halt, senhor. E me perguntei por que ele não foi condecorado ou homenageado por sua habilidade.
O barão pensou por um momento e então tornou a falar.
— Bem, você está certo, Will — ele confirmou. — Foi Halt. E eu quis homenageá-lo, mas ele não permitiu. Disse que arqueiros não recebem esse tipo de homenagem.
— Mas... — Will começou num tom perplexo, mas a mão erguida do barão o impediu de falar mais.
— Vocês, arqueiros, têm costumes próprios, Will, como tenho certeza de que está aprendendo. Às vezes, outras pessoas não os compreendem. Apenas escute o que Halt diz e faça o que ele faz, e estou certo de que você vai ter uma vida honrosa.
— Sim, senhor.
Will fez outra saudação quando o barão bateu as rédeas levemente no pescoço do cavalo e o fez virar em direção ao galpão da feira.
— Agora, chega de conversa. Não podemos tagarelar o dia inteiro. Vou jogar. Talvez este ano eu consiga acertar uma argola num daqueles benditos cubos.
O barão começou a se afastar, mas então pareceu lembrar-se de algo e parou por um segundo.
— Will — ele chamou.
— Sim, senhor?
— Não conte a Halt que eu lhe disse que ele conduziu a cavalaria. Não quero que ele fique zangado comigo.
— Sim, senhor — Will concordou com um sorriso.
Quando o barão se afastou, ele voltou a se sentar para esperar pelos amigos.

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